Musa Museu reuniu equipe e visitantes. Foto: Marcelo Ferreira |
Na manhã de 26 de maio, aconteceu o Sarau Poético Musa Museu como parte da programação executada pelo Museu Histórico de Sergipe dentro da XII Semana de Museus (IBRAM). Foi uma visita monitorada com intervenções poéticas diante de obras do acervo exposto. Os contadores Marcelo Ferreira, Rafael Conceição, Bruno Filipe, Eduardo Rosário, Luana Almeida e Thiago Fragata, coordenador, revezaram-se na leitura compartilhada diante do público.
De inicio, no lançamento da exposição "O Museu de Cultura Popular de São Cristóvão: como sonhava José Augusto Garcez", o museólogo Marcelo Ferreira fez leitura de texto de Zózimo Lima, onde o jornalista narra suas impressões de uma visita feita ao Museu de Arte e Tradição, em 1951. Confira no recorte:
Correio de Aracaju, 15 de setembro de 1951 |
Na sala do cangaço, diante de objetos que remetem a saga de Lampião, o monitor Rafael Conceição sacou o cordel Se Lampião fosse vivo, de Isabel Nascimento e disparou:
Rafael Conceição fez leitura de cordel |
SE LAMPIÃO FOSSE VIVO
Isabel Nascimento
O que impera hoje em dia
É a lei
da impunidade
Falta
de oportunidade
Desavença,
hipocrisia
Trago
uma analogia
Ao
período alusivo
Num
trabalho exclusivo
Sobre
os sertões “O Líder dos Sertões”
E em
quais situações
Nós o
desejamos vivo.
Com
injusto padecer
Nosso
povo humilhado
Sente-se
desamparado
Sem ter
a quem recorrer
Manda a
lei do poder
Num
proceder abusivo
Falta
gosto e incentivo
Pra
acabar com a Cobiça
Nesse
mundo de injustiça
Quem
dera Lampião vivo!
Eu vi
um deficiente
Procurar
pela Pericia
Pois trabalhou
na Policia
Antes
de um acidente
O
médico em sua frente
Com
olhar repreensivo
Disse,
em tom pejorativo:
“Vá
trabalhar, meu senhor!”
Disse
pr’esse Doutor:
Quem
dera Lampião vivo!
Já o “Cabra”
que tem saúde
Mas não
carrega uma caixa
Ata, no
braço, uma faixa
E sai
pedindo: “Me ajude!”
Sem ter
nenhuma virtude
Num
padecer inventivo
Chorando
sem ter motivo
Diz: “me
aposente, doutor!”
Diria a
esse enganador:
Quem
dera Lampião vivo
Virgulino,
sem saber
Tornou-se
Celebridade
Mesmo
com toda maldade
Que costuma
a fazer
No
tempo em que o poder
Tinha
cunho repressivo
Lampião
não foi passivo
Ao jugo
desta cobiça
Não
aceitava injustiça
No
tempo em que era vivo.
Nos
dias em que vivemos
De
avareza e de preguiça
Se
antes não tinha justiça
Agora
tem muito menos
Não se
respeita os pequenos
Pela
“Lei do Sobrevivo”
O
Dinheiro é decisivo
Em
nossa Sociedade
Pra
toda desigualdade
Quem
dera Lampião vivo! (...)
Vigaristas
mentirosos
Ricaços
Exploradores
Bandidos
Estrupadores
Policiais
Criminosos
Quem
maltratar os idosos
E que é
blasfemativo
Tem
instinto destrutivo
Vive
fazendo besteira
Cairia
na “Peixeira”
O monitor Bruno Filipe recitou uma poesia de Manoel Ferreira, obra que o primeiro diretor do Museu Histórico de Sergipe (gestão 1960/1970) ofertou em 2013, na ocasião da XI Semana Nacional de Museus.
Poeta Manoel Ferreira, ex-diretor do MHS |
MUSEU DE SERGIPE
Manoel Ferreira
Manoel Ferreira
São Cristóvão vibra e canta
Expressando prazer e
alegria,
Acolhendo no Museu de Sergipe
Honrosas e simpáticas
visitas.
O evento nos trás
recordações e saudades
Quando este humilde
operário,
Ocupando mandato de
Deputado Estadual
Indicou este palácio
consoante projeto de sua autoria
Sede do Museu de Sergipe.
Aqui se encontra
Acervo de maior
relevância
Alegrando e enriquecendo
De conhecimento, novas
gerações.
Museu de Sergipe
Meritória instituição
Pela relevância de seu
acervo
Conquistando respeito e
estima.
Thiago Fragata recitou versos que Freire Ribeiro dedicou ao MHS |
Em seguida, Thiago Fragata compartilhou versos que Freire Ribeiro dedicou ao Museu Histórico de Sergipe. A poesia foi extraída da obra "São Cristóvão em Sergipe D’El Rey", de 1971.
MUSEU
Freire Ribeiro
Penetro o Museu
No belo
Palácio!...
Bagnuolo
me fala
De luta
sangrenta
Que a
História aviventa!
Feroz
mortandade
As tropas
de Holanda
Brigando
nas ruas
Da nobre
cidade!
Labatut,
vai comigo...
Brigadeiros,
barões!...
Dom Pedro
Segundo
Outrora
bailando
De barbas
bem loiras,
Nos
grandes salões!
Esculturas
em pedra
-
tesouros achados
Na terra
enterrados
Num velho
convento,
- ruína
sagrada,
Sem
frades, sem santos,
No templo
ultrajado!
Cadeirinha
mimosa...
Onde negros
escravos
Chegados
do Congo?
Cadeirinha
saudosa
De linda
Senhora,
De langue
Donzela
De cor
duma estrela
Nas
montras da aurora!
Brazão
esplendente
Brasil
refulgente
Aos olhos
do mundo
Nos
fastos do Império
Com Pedro
Segundo!
Um
Cristo, obra-prima.
- imagem
sombria
Sem
braços, penando,
Em chagas
sangrando
Numa
imensa agonia!
A tarde,
lá fora,
Em luz se
desfaz:
São
Cristóvão é um ninho
De sonho
e de paz!...
Cachimbos,
taieiras,
Ferrenhos
punhais
Dos
cãibras do Norte
Instrumentos
terríveis
De cenas
de morte!
Canhões
de outras eras
Com limos
de glória,
Dormindo,
caducos,
Nas
noites da História!
Pistolas,
espadas
Mil
bravos lembrando
Cocares e
bestas
Com arcos
de índios
Nas
paredes pousando!
Horácio,
presente
Nos
quadros eternos
Da nossa
pintura!
Cenário
ameríndio:
Em tela
gigante
Cecília
dormindo
Em
selvagem piroga,
Em doce
postura
À sombra
do índio!
Régias
camas vazias
Com
lindos brocados,
Recordando
mil noites
Com
corpos amados!...
A cama é
um ninho,
Uma breve
pousada
Do corpo
que espera
A viagem
do nada!...
(...)
As
sombras me falam,
Os mortos
me chamam!
A tarde é
lá fora
Em
sanguínea agonia
Uma rosa
dorida!
O Palácio
está cheio
De vultos
fugidos
Das cenas
da vida!
A vida,
me chama!
São
Cristóvão cintila
Num lindo
poente
De
púrpura e ouro
Na tarde
tranqüila!
Adeus,
São Cristóvão!
O intérprete Eduardo Rosário fez a leitura de um trecho do romance "O Guarani" (1857), de José Alencar. Sabe-se que esta obra inspirou o artista laranjeirense Horácio Hora a fazer sua obra-prima, Peri e Ceci, em 1882. O Museu Histórico de Sergipe guarda o maior acervo do artista festejado como representante do romantismo brasileiro nas artes plásticas.
O GUARANI
(...)
Quando o sol, erguendo-se no horizonte, iluminou os
campos, um montão de ruínas cobria as margens do Paquequer. Grandes lascas de
rochedos, talhadas de um golpe e semeadas pelo campo, pareciam ter saltado do
malho gigantesco de Novos Ciclopes. A eminência sobre a qual estava situada a
casa tinha desaparecido, e no seu lugar via-se apenas uma larga fenda
semelhante à cratera de algum vulcão subterrâneo.(...)
Quem plainasse nesse momento sobre aquela solidão,
e lançasse os olhos pelos vastos horizontes que se abriam em torno, se a vista
pudesse devassar a distancia de muitas léguas, veria ao longe, na larga esteira
do Paraíba, passar rapidamente uma forma vaga e indecisa. Era a canoa de Peri,
que impelida pelo remo e pela viração da manhã corria com uma velocidade
espantosa, semelhando uma sombra a fugir das primeiras claridades do dia.
Toda a noite o índio tinha remado sem descansar um
momento; não ignorava que D. Antônio de Mariz na sua terrível vingança havia
exterminado a tribo dos Aimorés, mas desejava apartar-se do teatro da
catástrofe, e aproximar-se dos seus campos nativos. Não era o sentimento da
pátria, sempre tão poderoso no coração do homem; não era o desejo de ver sua
cabana reclinada à beira do rio e abraçar sua mãe e seus irmãos, que dominava
sua alma nesse momento e lhe dava esse ardor.
Era sim a ideia de que ia salvar sua senhora e
cumprir o juramento que tinha feito ao velho fidalgo; era o sentimento de
orgulho que se apoderava dele, pensando que bastava a sua coragem e a sua força
para vencer todos os obstáculos, e realizar a missão de que se havia
encarregado.
Quando o sol, no meio de sua carreira, lançava
torrentes de luz sobre esse vasto deserto, Peri sentiu que era tempo de abrigar
Cecília dos raios abrasadores, e fez a canoa abicar à beira do rio na sombra de
uma ramagem de árvores.
A menina envolta na sua manta de seda, com a cabeça
apoiada sobre a proa do barquinho, dormia ainda o mesmo sono tranqüilo da
véspera; as cores tinham voltado, e sob a alvura transparente de sua pele
brilhavam esses tons cor-de-rosa, esse colorido suave, que só a natureza,
artista sublime, sabe criar.
Peri tomou a canoa nos seus braços, como se fora um
berço mimoso, e deitou-a sobre a relva que cobria a margem do rio; depois
sentou-se ao lado, e com os olhos fitos em Cecília, esperou que ela saísse
desse sono prolongado que começava a inquietá-lo. Tremia lembrando-se da dor
que sua senhora ia sentir quando soubesse a desgraça de que ele fora testemunha
na véspera; e não se achava com forças de responder ao primeiro olhar de
surpresa que a menina lançaria em torno de si, logo que despertasse.
Vinicius de Morais dedicou poesia ao artista sergipano Jenner Augusto |
Finalizando as atividades do Sarau Poético Musa Museu, a acadêmica de Turismo, Luana Almeida, recitou versos que Vinicius de Morais dedicou ao artista sergipano Jenner Augusto.
JENNER AUGUSTO, ARTISTA PINTOR
Vinicius de Morais
Trouxeste de Sergipe
A contida paixão, a ascese, a fome, o fulcro
Da alma nativa, a agreste crispação
Da mata branca da caatinga, a alta tensão
Da palha de onde os pássaros
Se picam ao latir dos estampidos
De uma nova vingança, os descaminhos
Da vingança, os paroxismos
Da herança, as consoantes da palavra honra
O fulgor azul das laminas, o grito
Vermelho dos estupros, o olho injetado e morto dos coágulos.
A contida paixão, a ascese, a fome, o fulcro
Da alma nativa, a agreste crispação
Da mata branca da caatinga, a alta tensão
Da palha de onde os pássaros
Se picam ao latir dos estampidos
De uma nova vingança, os descaminhos
Da vingança, os paroxismos
Da herança, as consoantes da palavra honra
O fulgor azul das laminas, o grito
Vermelho dos estupros, o olho injetado e morto dos coágulos.
(...)
Meu irmão Jenner Augusto
Meu irmão Jenner Augusto
Pintor dos que mais sabem e mais aprendem
Cheio de inexprimível piedade
Pelo homem, esse bicho tão pequeno
Pinta-me uma cidade
Onde viva em paz, se sofra menos
Uma branca cidade
Sempre crepuscular e em tons serenos
Onde eu possa iludir-me
Sobre o amor, sobre a dor e sobre o tempo
E morrer me esvaindo
No doce balbucio das estrelas.
Cheio de inexprimível piedade
Pelo homem, esse bicho tão pequeno
Pinta-me uma cidade
Onde viva em paz, se sofra menos
Uma branca cidade
Sempre crepuscular e em tons serenos
Onde eu possa iludir-me
Sobre o amor, sobre a dor e sobre o tempo
E morrer me esvaindo
No doce balbucio das estrelas.
FONTES DE PESQUISA
ALENCAR, Jose de. O Guarani. Rio de Janeiro: INL, 1958.
FERREIRA, Manoel. Museu de Sergipe (poesia). São Cristóvão, 2013. Digitado. Acervo MHS.
NASCIMENTO, Isabel. Se Lampião fosse vivo. Aracaju,
set. 2007. (Literatura de cordel)
Ribeiro, Freire. São Cristóvão
em Sergipe D’El Rey (poesia).
Aracaju, 1971.
MORAIS, Vinicius de. Jenner Augusto, artista plural (poesia). In:
PONTUAL, Roberto. Jenner e a
Arte Moderna na Bahia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1974, p. 121.
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