Museu Histórico de Sergipe. Foto: Marcelly (ASCOM/SECULT) |
Espaço para a divulgação das atividades do Museu Histórico de Sergipe/SECULT, situado em São Cristóvão - SE. As opiniões expressadas nos artigos dos colaboradores são da exclusiva responsabilidade dos seus autores, e não necessariamente refletem o pontos de vista do MHS.
terça-feira, 25 de setembro de 2012
MHS promove atividades dentro da 6ª Primavera dos Museus
O Museu Histórico de Sergipe (MHS), unidade da Secretaria de Estado da Cultura (Secult), integra a programação da 6ª Primavera dos Museus, uma ação coordenada pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram/MinC). No próximo dia 28 de setembro o MHS irá promover duas atividades que irão chamar a atenção para o tema deste ano do evento: ‘A Função Social dos Museus’.
Coordenada pelo Ibram, a Primavera dos Museus tem por objetivo chamar a atenção de museus e sociedade para o debate em torno de assuntos atuais por meio de exposições, seminários, oficinas, palestras, etc. A programação da 6ª edição do evento, que acontece entre os dias 24 e 30 de setembro, conta com 2.400 atividades que serão realizados em cerca de 800 museus espalhados por 364 municípios brasileiros.
sexta-feira, 21 de setembro de 2012
A FUNÇÃO SOCIAL DOS MUSEUS
Carlos Braz*
No período de 24 a 30 de setembro acontece em todas
as unidades museais do Brasil, cadastradas no Instituto Brasileiro de Museus
(IBRAM), a VI Primavera dos Museus, evento cujo tema central será a função
social desses espaços, presentes em quase todos os recantos do país. Foi-se o
tempo em que os museus eram palácios iluminados para iluminados, restritos à
elite detentora do poder e do conhecimento, distantes das comunidades em seu
entorno, desatentos aos seus anseios e necessidades, guardião de objetos apenas
úteis para contemplação de poucos. O movimento intitulado Nova Museologia, que
teve início em meados da década de 70 do século passado, direcionou as casas de
memória para um novo patamar, democratizando-as, e levando-as a atuar como
ferramenta inclusiva de grupos desassistidos socialmente, com acervos
potencializados como fonte de transmissão de conhecimento e evolução cultural. Quarenta
anos passaram-se desde a realização da Mesa Redonda de Santiago do Chile,
patrocinada pelo ICOM, Conselho Internacional de Museus, em Maio de 1972, que
deliberou que o
“museu é uma
instituição a serviço da sociedade e seu desenvolvimento, da qual é parte
integrante e que possui neles mesmos os elementos que lhe permitem participar
na formação da consciência para o engajamento dessas comunidades na ação,
situando suas atividades em um quadro histórico que permita esclarecer os
problemas atuais, isto é, ligando o passado ao presente; engajando-se nas
mudanças de estrutura em curso e provocando outras mudanças no interior de suas
respectivas realidades nacionais”.
Uma lenta, porém visível revolução entrava em curso. Surgiram os museus globais, alterando o dia de áreas antes degradadas, verdadeiros espetáculos arquitetônicos onde exposições de arte, com uma nova dimensão, ganharam a mídia sendo notícia universal, ao tempo em que os espaços tradicionais de memória, com nova dinâmica e antenados aos novos tempos, contabilizavam um aumento expressivo no seu número de visitantes, e cursos técnicos e superiores de Museologia começaram a ser criados em países sul-americanos.
Metas desafiadoras foram traçadas desde então, em face de uma conturbada cena político-social na América Latina, palco constante de liberdades individuais suprimidas e reivindicações de minorias. As sementes lançadas ao vento em terras chilenas, naturalmente, não germinaram a contento, com muito ainda a ser executado.
A diretriz N. 10 do I Encontro Ibero-americano de Museus, realizado em Junho de 2007 na cidade de Salvador-BA, ratificou a necessidade de
“compreender
o processo museológico como exercício de leitura do mundo que possibilita aos
sujeitos sociais a capacidade de interpretar e transformar a realidade para a
construção de uma cidadania democrática e cultural, propiciando a participação
ativa da comunidade no desenho das políticas museais”.
Assim, compreendemos que em grande parte do
continente latino americano o museu como espaço de convivência sócio cultural é
um sonho ainda a ser realizado.
No Brasil, a cena museológica cristaliza-se nas páginas da publicação Museus em Números, publicada pelo Ministério da Cultura no ano de 2011, cujo diagnóstico permite entrever as disparidades existentes, onde as instituições do sudeste sobressaem-se em termos de gestão voltada para ações sociais.
No campo doméstico, Sergipe vive hoje um momento de
expansão com o surgimento de novos espaços de cultura e memória. Em Aracaju, no
ano de 2010 cria-se o Palácio Museu Olímpio Campos e em seguida o Museu da
Gente Sergipana, repleto de atraentes tecnologias que contribuem positivamente
para uma melhor compreensão, por parte da sociedade, da finalidade dos museus.
No interior do estado nasce o Museu de Itabaiana, ao lado do Museu do Cangaço,
no município de Frei Paulo, povoado Alagadiço iniciativas inéditas naquela
região. Museu Histórico de Sergipe e o Museu de Arte Sacra, ambos em São
Cristovão, e o Museu Afro Brasileiro de Sergipe, no município de Laranjeiras,
funcionam plenamente há vários anos.
Em breve contaremos com o Museu da Policia Militar, em São Cristovão, e em Aracaju teremos o Museu do Mangue, a Casa de Cultura Jenner Augusto, e o espaço Zé Peixe, que, juntando-se a outros já existentes, completam um elenco considerável em número de instituições.
Dez museus do nosso Estado responderam ao questionário enviado para a formação do cadastro do IBRAM, um número sugestivo, levando-se em conta sermos o menor estado da federação. Destes, 60% afirmam que realizam ações educativas, sem dúvida um excelente percentual, que, todavia, não causa mudanças perceptíveis no meio social. Apenas um declarou possuir orçamento próprio e nenhum conta com a parceria de Associações de Amigos do Museu.
Ao mesmo tempo, o mercado cultural/museal começa a receber os bacharéis em Museologia formados na Universidade Federal de Sergipe (UFS), profissionais competentes, ansiosos para mostrarem seus conhecimentos, aptos a participarem ativamente na construção da estrutura necessária para transformar nossos museus em entidades que efetivamente promovam significativas transformações sociais, através dos seus projetos.
A função social do museu em Sergipe ainda não é perceptível para muitos, dependendo de várias outras ações para sua efetivação. Uma análise objetiva deixa entrever que é imprescindível a presença de museólogos e equipes multidisciplinares a serviço das instituições, que apoiadas por políticas público-privadas, transformem os museus em espaços socialmente importantes, agentes de mudança social e desenvolvimento. A VI Primavera dos Museus torna-se, portanto, uma oportunidade impar para se refletir sobre o assunto.
* Carlos Braz é acadêmico do Curso de Museologia na
Universidade Federal de Sergipe. Email: carlos_braz@globo.com
FONTES:
FORUM NACIONAL DE MUSEUS (2008). Museus como agentes de mudança social e desenvolvimento:
relatório. Brasília: Minc/IBRAM, 2010.
IBRAM. Museu
em Números 2011. Brasília, 2011. (Vol. 2)
NASCIMENTO JR, José do; CHAGAS, Mario de Souza
(Orgs.) IBERMUSEUS 1 - Panoramas
museológicos da Íbero América. 2ª. edição. Brasília, 2010.
terça-feira, 18 de setembro de 2012
CURTA-SE 12 - SÃO CRISTÓVÃO
O Museu Histórico de Sergipe, unidade da Secult, sediará a mostra do CURTA-SE 12 em São Cristóvão, dia 21 de setembro, sexta, a partir das 16:00 horas. Confira a programação dos filmes selecionados:
Mostra Informativa de Curtas - Cine Meio Ambiente "O futuro que queremos"
A Vida no mangue. Direção: alunos EMEF Martim Lutero, 2010. Animação (ES)
Os sustentáveis. Direção: Lisandro Santos, 2012. Animação (RS)
Um sol de Jacaré. Direção: Rosa Berardo, 2011. Ficção (GO)
Desabrigados. Direção: Alexandre Costa, 2012. Animação (MG)
O Girassolzinho. Direção: Douglas Soares, 2012. Animação (RJ)
Hainá - Eco. Direção: Arnaldo Galvão, 2011. Animação (SP).
O Cangaceiro e o leão. Direção: Arnaldo Galvão, 2012. Animação (SP)
Hainá - O Filtro. Direção: Arnaldo Galvão, 2011. Animação (SP).
Rap Consciente - videoclipe. Direção: Alunos da EMEF Amnóphis de Assis. Animação (ES)
A Garça Graça. Direção: Alunos da EMEF Tânia Pôncio Leite. Animação (ES)
SABER MAIS!
sábado, 8 de setembro de 2012
LAMPIÃO: bandido, herói e outros adjetivos
Lampião, xilogravura de Nivaldo Oliveira compõe exposição do MHS |
Thiago Fragata*
O
cangaço influenciou boa parte dos movimentos sociais
que pontificaram o Brasil no século XX. No século XXI o fato se renova, a insinuação da
homossexualidade de Lampião constitui um bom exemplo porque atrelar qualquer
tema ao cangaço ou buscar inspiração nele significa atrair público, a opinião
pública.
O
fato é que ninguém consegue ficar alheio ao cangaço e seu maior representante,
o afamado Virgulino Ferreira da Silva, apelidado Lampião. Já em 1937, Jorge
Amado inseriu na sua obra Capitães da
Areia uma importante observação: “porque a população dos
cinco estados, de Bahia, Pernambuco, Alagoas, Paraíba e Sergipe, vive com os
olhos fitos em Lampião. Com ódio e com amor, nunca com indiferença”. Acrescentaria Ceará e Rio Grande do Norte.
Nos
dias atuais vemos estudiosos apaixonados pelo
exemplo de resistência ao mandonismo dos coronéis e desenvoltura perante as
adversidades do sertão nordestino. A saga lampiônica começou em 1918 e findou na
Grota de Angicos, Poço Redondo, em 1938, somando 20 anos de ataques, fugas e
revides. Invariavelmente, figuram adjetivos nas
obras em geral que tematizam o cangaço, mesmo trabalhos
acadêmicos com foros de imparcialidade, que desvelam um olhar engajado. Se no
meio acadêmico o cangaço tem seus mais ardorosos simpatizantes, com raríssimas
exceções, imagina no seio das populações que conviveram e tiveram experiência
positivas ou negativas.
A
discussão bandido ou herói dividiu e divide a sociedade. Folheando alguns
livros recolhemos expressões curiosas e/ou adjetivos que representam opiniões.
Vejamos repertório de Frederico Bezerra Maciel, legítimo representante
dos defensores da missão divina e heroica de Virgulino Ferreira da Silva:
Rei
do cangaço, Senhor absoluto do sertão, Sua Majestade Lampião, Imperador do
Sertão,
Rei do Norte, Governador Lampião,
Hobin Hood do Nordeste, Interventor do Sertão, Sinhô Lampião, Gênio em tudo, Homem de palavra, Justiceiro, O mesmo [para Bahia] o
que fora Padre Cicero para Juazeiro, Ídolo de todos, Invulnerável, Invencível, Eterno,
Lampião era o povo, Símbolo
das reivindicações sociais, O sertão ínterim, Libertador dos homens explorados do sertão imenso, Paterno e dócil na intimidade, napoleonicamente enérgico
no comando, Maior guerrilheiro das Américas, Portador de uma luz
de inteligência superior, penetrando até os domínios da
cultura, dentre outros.
Por
outro lado, minoria de estudiosos renitentes, ora
estribado no argumento da legalidade, do Estado de direito, ora afetado pelas
estripulias praticadas por Lampião e seus asseclas contra populações
indefesas, enfileiram acusações e adjetivos contundentes
contra o vilão. Para pesquisadores como Frederico Pernambucanos
de Mello e Rodrigues de Carvalho a completa
definição de Lampião inclui os termos:
“Criminoso, truculento celerado, bandido sem
ética, alienado mental, nocivo, rapace por cleptomania, sadicamente perverso, imoral
currador dos infelizes sertanejos, taciturno caolho, refece profissional, tenebroso
celerado, avarento, corruptor das famílias, anjinho de asa de morcego, carne de
pescoço infernal, catingueiro e sagaz, soturno sicário, miserável refece, terrível
sicário, ardiloso sicário semi-analfabeto, espírito de porco espinho, demônio
de sagacidade e esperteza, facínora destituído de humanidade, lombrosiano”,
dentre outros adjetivos.
No universo da literatura de cordel é
recorrente o tema cangaço. Não é difícil encontrar os títulos referente a
chegada de Lampião no céu, no inferno e mesmo ao purgatório. Declara Maria
Ângela de Faria Grillo que nos cordéis “as
representações sobre cangaceiros diferem das encontradas nos livros didáticos o
na literatura oficial. Quase sempre tratados como bandidos nestes espaços, nos cordéis
são, pelo menos, mais contraditórios”, ou seja, são assassinos mas são
românticos, roubam mas ajudam os pobres, enfim, possuem carga heroica.
Lampião dos cordéis mantém traço heróico e contraditório |
Numa rápida leitura de A chegada de Lampião no Céu (s/d), de Rodolfo Coelho Cavalcante; de A chegada de Lampião no inferno, de José Pacheco, e A Chegada de Lampião no purgatório (s/d), de Luiz Gonzaga de Lima (1981) captamos a impressão a respeito da polêmica bandido x herói. Lampião retratado por Rodolfo Coelho Cavalcante não merece entrar no céu por isso é mandado ao purgatório. Daí foi expulso por São Miguel, segundo verso de Luiz Gonzaga de Lima. No inferno não ficou, agora expulso por Lúcifer, desde então vaga pelos sertões feito alma penada a soprar estórias e inspirando arte popular nordestina, tudo para não deixar o Brasil esquecer o cangaço.
*Thiago
Fragata – pesquisador, especialista em
História Cultural pela Universidade Federal de Sergipe (UFS), sócio efetivo do
Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe (IHGSE) e diretor do Museu Histórico
de Sergipe (MHS/SECULT). Matéria especial para o blog do Museu Histórico de Sergipe e sua
exposição “Cangaço: por dentro do emborná e na ponta do punhá” (22 de agosto a
22 de setembro de 2012).E-mail: thiagofragata@gmail.com
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
AMADO, Jorge. Capitães da Areia. 86ª Ed. Rio de
Janeiro: Record, 1996.
CARVALHO, Rodrigues
de. Lampião e a sociologia do cangaço.
Rio de Janeiro: Gráfica Editora do Livro, 1976.
CAVALCANTE, Rodolfo
Coelho. A chegada de Lampião no céu.
São Paulo: Editora Luzeiro, SD. (Literatura de cordel)
GRILLO, Maria Ângela
de Faria. História em verso e reverso. Revista
de História da Biblioteca Nacional.
Rio de Janeiro, ano 2, N. 13, out. 2006, p. 82-85.
LIMA, Luiz Gonzaga
de. A chegada de Lampião no purgatório.
São Paulo: Editora Luzeiro, 1981 (Literatura de cordel)
MACIEL, Frederico Bezerra. Lampião, seu tempo e seu reinado. 2ª
edição. Ed. Vozes. Petrópolis, 1982.
MELLO, Frederico
Pernambucano. Guerreiros do Sol:
Violência e Banditismo no Nordeste Brasileiro. Recife: Massangana/Girafa, 2004
PACHECO, José. A chegada de Lampião no inferno. São Paulo: Editora Luzeiro, SD. (Literatura
de cordel)
quarta-feira, 5 de setembro de 2012
O cangaço em Sergipe
Maria Bonita e Lampião, escultura de Felix Santos, compõe exposição no MHS. |
Carlos Brás*
O pequenino Sergipe,
entre todos os estados pelos quais o flagelo do cangaço deixou suas
marcas, tem lugar de destaque. Entramos definitivamente para a
história do banditismo nacional, de forma excepcional e definitiva,
no dia 28 de Julho de 1938, quando na gruta de Angicos, localizada no
município de Poço Redondo, o tenente alagoano João Bezerra e sua
volante, liquidou Virgulino Ferreira da Silva, o afamado Lampião, e
parte de seus seguidores, interrompendo um reinado de quase 20 anos.
O fenômeno social
cangaço teve como pano de fundo o sofrido sertão nordestino com sua
temível caatinga, ambiente inóspito, pouco povoado, onde só os
fortes sobrevivem. O Raso da Catarina, em território baiano,
sintetiza toda a insalubridade e aridez dessa região do Brasil.
Tempos medonhos aqueles, onde a presença do estado quase não se
fazia notar com o domínio socioeconômico exercido por poderosos
coronéis, proprietários de imensos latifúndios, soberanos da terra
e da gente, da vida e da morte. A miséria e os constantes conflitos
políticos e familiares estão entre os motivos que originaram a
escalada da violência, justificando a formação de grupos armados
particulares, onde ferozes jagunços garantiam a segurança dos seus
patrões.
“Lampião nasceu há
muitos anos, em todos os estados do nordeste”, conforme cita
Graciliano Ramos no seu livro Viventes das Alagoas (1962).
Ser cangaceiro era o grito de revolta dos que não aceitavam a
opressão e injustiça. Desse cotidiano participaram outros
personagens que muitas vezes faziam jogo duplo, a depender de
interesses pessoais. Volantes, grupos formados por soldados (chamados
de macacos pelos cangaceiros) e cachimbos (civis contratados pelo
estado), que praticavam todo o tipo de violação contra a população
dos povoados e grotões, sendo tão temidos quanto os bandoleiros.
Coiteiros (moradores da zona de conflito, que forçados ou não,
auxiliavam os bandidos com suprimentos e esconderijo) enfim uma rede
de omissão, medo e cumplicidade que permitiu a longa duração do
reinado lampiônico.
Mesmo passadas tantas
décadas dos combates encarniçados e da morte do seu líder maior,
este triste enredo ainda desperta paixões. O cangaço é uma epopeia
repleta de contradições com relação a comportamento, datas e
acontecimentos. A mitificação do general da caatinga é responsável
pela aura que o cerca, imagem de herói e bandido, que povoa o
imaginário popular, promovendo debates, movimentando um circulo
gerador de divisas através de manifestações artísticas e
culturais, teses acadêmicas, artigos e investigações sociológicas.
Essa condição permite
afirmar que o rei do cangaço teve, na realidade, três vidas
distintas: 1) o homem comum, vaqueiro, almocreve e coureiro; 2) O
facínora amado e odiado; 3) o personagem imorredouro, eternizado em
cordéis, filmes, literatura, história em quadrinhos, telenovelas,
artes plásticas e folguedos populares.
Xilogravura de Nivaldo Oliveira compõe exposição do MHS |
Em solo sergipano, os
grupos de famigerados com seu chefe à frente, adentram pela primeira
vez no dia 26 de fevereiro de 1929. A cidade de Carira foi escolhida
para a indesejável visita dos fugitivos das volantes baianas. Dessa
empreitada, conforme alguns relatos participaram apenas sete feras
sedentas de tudo, o que já era suficiente para aterrorizar qualquer
povoação, e ali se utilizou mais uma vez a tática do bom
visitante, amigo, cordial e respeitoso, que não pretendia cometer
atos violentos, pagando por tudo que precisava, e promovendo festas.
As estripulias em nossas
terras gradativamente tornaram-se rotineiras. O rastro do mal logo se
fez notar, trazendo ao pacato sergipano a dor da humilhação, as
lágrimas pelos entes queridos ultrajados em sua honra ou mortos, as
chantagens e extorsões. Como sempre acontecia, uma rede de
colaboradores logo foi arquitetada, garantindo uma relativa segurança
à cabroeira. Curiosamente, conforme relatos, o estado de Sergipe foi
o que mais contribuiu com elementos para os grupos de meliantes,
através do município de Poço Redondo.
No livro A misteriosa
vida de Lampião, de autoria do cearense Cincinato Ferreira Neto,
à página 158, encontra-se alusão ao nome de Eronildes de Carvalho,
futuro interventor de Sergipe, e seu pai, Sr. Antônio Caixeiro, como
um dos maiores protetores de Virgulino em nossas terras, fato este
que é contestado enfaticamente pelos familiares dos citados.
Nossa Senhora da Glória,
Pinhão, Frei Paulo, Alagadiço, Gararú, Aquidabã, Saco da Ribeira
(Ribeirópolis), Monte Alegre, Canindé e Capela, onde a célebre
chegada do malfazejo é contada até hoje, foram cidades testemunhas
da aventura cangaceira. E muitos ainda recordam desse tempo sinistro.
O nome de Zé Baiano, com seu ferro em brasa, que deixou marcas
indeléveis no corpo de algumas mulheres ainda causa repulsa na
imagem evocada.
Lampião foi senhor
absoluto do seu tempo. Enquanto uns o consideravam um facínora
impiedoso e sanguinário, capaz das piores atrocidades, outros lhe
atribuíam qualidades, tais como, caridoso, sábio, bondoso, justo,
educado, refinado, artista etc. Porém, historiadores e pesquisadores
respeitados pela seriedade de seus trabalhos, são unanimes quando
reconhecem no capitão a astúcia de um guerrilheiro, o tino
estratégico e inteligência de um militar experimentado. Implacável
quando se tratava de vingança e autoafirmação. Benevolente quando
precisava de proteção, exercia liderança absoluta sobre seus
comandados, o que lhe permitiu sobreviver, lutando sempre em
desvantagem, sendo vencido apenas pela traição.
A derrota, mais cedo ou
mais tarde haveria de chegar, e em Angicos se escreveu a última
página dessa dolorosa saga brasileira. Dali escaparam alguns, que
ajudaram a perpetuar a lenda. Corisco, alcunhado de “Diabo Louro”,
ausente no combate final, responsabilizou-se pelo funesto epílogo,
promovendo como vingança mais mortes brutais pela região. Consta
que a morte de Lampião em 28 de
julho de 1938 não significou o fim do cangaço, a esperança de sua continuidade findou-se com Corisco no dia 25 de maio de 1940.
Corisco, o Diabo Louro em forma de cangaceiro |
*Carlos Brás é pesquisador e acadêmico de Museologia da Universidade Federal de Sergipe,
estagiário do Museu Histórico de Sergipe/SECULT. E-mail: carlos_braz@globo.com
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
MACIEL, Frederico
Bezerra. Lampião, seu tempo e seu reinado. 2ª edição. Ed. Vozes. Petrópolis, 1982. (volumes IV e
VI)
FERREIRA NETO, Cincinato.
A misteriosa vida de Lampião. Fortaleza: Premius, 2008.
RAMOS, Graciliano.
Viventes das Alagoas. 8ª edição. Rio de Janeiro: Record,
1962.
Cartaz da exposição do MHS |
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