Serafim Santiago (1860/1932)
escreveu o Anuário Christovense no início do século XX. O manuscrito esteve
durante muito tempo à disposição dos pesquisadores no Instituto Histórico e
Geográfico de Sergipe (IHGSE), em Aracaju. No ano de 2009, a obra foi publicada pela Universidade Federal de Sergipe. O livro de memórias retrata São
Cristóvão, suas festas e seu povo, no evolver do século XIX e inicio do XX.
QUEM FOI SERAFIM SANTIAGO?
Memorialista e
funcionário público. Filho de José Florêncio e Umbelina Santiago. Nasceu em São
Cristóvão a 4 de janeiro de 1859 e faleceu no mesmo município a 1º. De setembro
de 1932. Casou-se com Sara em 25 de junho de 1887. Foi pai de 9 filhos (7 são
citado no anuário: João B. Santiago, Benjamin, Serafim de Santiago Junior,
Francisca Xavier de Santiago, Umbelina Santiago Prudente, Anita, Pedro). Mudou-se
para Aracaju em 29 de junho de 1887, onde exercera o funcionalismo público. Aos
60 anos, começou a escrever as memórias sobre a vivencia em São Cristóvão que
resultariam no mais rico e inédito depoimento sobre a cultura sergipana do
final do século XIX até as primeiras décadas do século XX.
O QUE ELE CITA DO CARNAVAL QUE ENVOLVE O PRÉDIO DO MHS?
Até a Mudança da Capital,
de São Cristóvão para Aracaju, fato ocorrido em 17 de março de 1855, o sobrado onde
funciona o Museu Histórico de Sergipe serviu de Palácio Provincial, ostentando inclusive
o brasão imperial, por aproximadamente 30 anos (1825/1855). Houve um Presidente
da Província, denominação para Governador a época, que realizou a brincadeira
do entrudo nas dependências do Palácio Provincial. Nome do Governador? Silencia
o velho Apolinário José Moura de quem Serafim Santiago ouviu o fato pitoresco.
Museu Histórico de Sergipe, antigo Palácio Provincial de Sergipe. Foto: Marcelle Cristinne (ASCOM/SECULT) |
“Estas festas que
outrora se chamavam Entrudo, hoje tem o nome de Carnaval, época do prazer, que
não podia deixar de ter também os seus dias consagrados. A Mitologia criou uma
boa porção de deuses, especializando Momo, o deus da sátira e do riso, que,
desprezando todas as desgraças e tristezas, veio se confundir em meio ao
bacanal encarnada nesse outro deus – Baco – que representa o vinho, a loucura
fantástica, enfim. As festividades obscenas de Roma, as saturnais, festas de
uma torpeza inominável, consagradas ao culto de Saturno, deixaram no mundo
romano as mais asquerosas tradições porque emblemavam o cúmulo da fraqueza
humana, as paixões mais vergonhosas e instintos mais aproximados da
bestialidade. Quanto ao entrudo, este estúpido divertimento ali usado por
longos anos, sua origem vem da falsidade, traição e emboscadas. Com tudo, os
cristovenses tornavam-se loucos com tal divertimento, por não ali conhecido o
Carnaval, este que o povo atualmente abraça cegamente para esquecer as
contrariedades da vida, procura “evoés e você me conhece?” o esquecimento dos
atrasos comerciais, dos abalos morais, etc. Em São Cristóvão o atraente
divertimento do Entrudo no Domingo Gordo ou Quinquagésima, há longos anos passados,
chegou sua influência até o Palácio Presidencial. Tivemos na antiga cidade, um
Presidente tão influído, que no referido Domingo do Entrudo, recebia os amigos
e correligionários com a mesma franqueza e amabilidade do costume, usando com
toda a sinceridade, a falsidade que exige o falso e traidor divertimento,
mandando agarrar os amigos e visitantes, vestidos decentemente, e mergulhavam
numa grande bacia cheia de água bem perfumada que se achava oculta. Esta
narração ouvi repetidas vezes pelo meu velho amigo Apolinário José Moura. De
muitas mortes até ainda hoje me recorda, todas as conseqüências do mal
entendido divertimento, assim como muitas desconfianças de amizades de famílias
cristovenses. Até o ano de 1912, não era usado o carnaval em São Cristóvão,
sendo que no referido ano, este festejo foi feito ali com verdadeiro esmero e
grande entusiasmo. Como em tempo remoto era muito respeitada a religião do
Calvário, o estúpido divertimento (o entrudo) só terminava por completo, às 8
horas da noite de terça-feira de entrudo, quando ouvia-se dobrar o sonoro e
grande sino de São Francisco, anunciando aos fiéis a entrada da quaresma no dia
seguinte (quarta-feira de Cinzas)”.
*Thiago Fragata é
poeta e historiador, diretor do Museu Histórico de Sergipe (MHS/SECULT). Email:
thiagofragata@cultura.se.gov.br
FONTES DA PESQUISA
SANTIAGO, Sant’Iago.
Annuario Christovense ou Cidade de São
Christovão. São Cristóvão: Editora da UFS, 2009, p. 177-178.
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